segunda-feira, 12 de outubro de 2009

As três faces da luz


Após escolher a localização e a estratégia de vendas, nenhum tema é tão influente em um projeto de ponto-de-venda como a questão da luz. Entretando vemos que sua compreensão ainda gera inúmeros equívocos, até mesmo entre alguns especialistas, pois não podemos entender a luz somente como um fenômeno físico, nem puramente como um aspecto ergonômico, nem cultural. A compreensão da luz no ponto-de-venda passa pela somatória equilibrada dessas três dimensões e assim acaba pertencendo a ao campo da prática acima de tudo, do desenvolvimento contínuo de experiências e da observação com o devido conhecimento técnico que a atividade do projeto luminotécnico exige.

A luz como fenômeno físico:

A intensidade luminosa sobre uma área ou superfície do ambiente é chamada lux, ou luminância. Se essa grandeza bastasse a solução para um bom projeto luminotécnico estaria praticamente resolvida, prevendo-se através de cálculos matemáticos quantos lux teríamos nos produtos expostos na loja, que deveria girar em torno de 500 lux para a maioria das situações, e uns 800 lux para o ponto de interesse nas vitrines. O cálculo utiliza a capacidade das lâmpadas em gerar fluxo luminoso medido em lúmens, bem como sua distância até a superfície que terá o efeito de luminância, incluindo aí dados do ambiente e das luminárias.

Isso seria a alegria dos que acreditam em cálculos, mas como veremos adiante seria um equívoco apostar apenas nessa dimensão. Para comprovar isto de uma vez por todas, basta utilizar um luxímetro e percorrer alguns ponto-de-venda e verificar a relatividade das leituras em lux nas mercadorias, pois haverão pontos aparentemente muito pouco iluminados mas satisfatórios na leitura acima dos 500 lux, e outros pontos abaixo de 300 lux mas com uma ótima e agradável visibilidade. A experiência prática geralmente contraria os cálculos pois a luz irá gerar o fenômeno da visão, assunto que pertence ao mundo da medicina e da ergonomia, bem como gerará significados, o que pertence ao universo cultural ou estético (e suas outras matérias de estudo, como a semiótica e a neurolinguística).

A luz no fenômeno da visão:

Nosso corpo é uma máquina fantástica, dotada de incontáveis dispositivos de adaptação a situações extremas internas e externas ao nosso organismo. Não é difeferente com o sentido da visão, por isso conseguimos caminhar à noite apenas sob a luz natural das estrelas e da lua, o que representa algo em torno de 0,002 a 0,2 lux, enquanto durante o dia suportamos mais de 20.000 lux de luz direta do sol.

E não nos adaptamos somente às variações de luminância, mas também a temperatura da luz (medida na escala Kelvin ou K), que é a tonalidade da fonte de luz, podendo ser mais fria (azulada) ou quente (amarelada). Nos surpreendemos ao saber que a luz do dia é azulada pois nunca pudemos notar isso aparentemente, mas se estivermos dentro de um grande ambiente com lâmpadas de tonalidade neutra ou quente, vamos olhar para fora do ambiente por uma janela ou vitrine e notaremos que lá está tudo levemente azulado. Essa regulação de tonalidade ocorre em nosso cérebro e torna as imagens muito mais agradáveis do que talvez elas sejam quando captadas em nossos olhos. Para comprovar o fenômeno, basta utilizar uma câmara fotográfica digital sem compensação automática de tonalidade dos brancos e tirar fotos em diferentes tipos de ambiente, algumas parecerão amareladas (sob a luz incandescente) e outras ficarão azuladas (sob a luz fluorescente comum ou sob a luz do sol). Provavelmente já nos deparamos em situações como esta.

Em uma loja de rua com uma entrada com porta de enrolar ou com fartas áreas de vitrine, é comum o varejista se queixar da loja parecer escura durante o dia, isto porque do lado de fora estaremos com 10 a 20 mil lux e no interior da loja até poderemos estar com um nível adequado de luminância de 500lux, porém nossa pupila (que se abre ou fecha para regular a passagem de luz para a retina) irá estar levemente contraída na presença ofuscante da luz solar intensa, assim o interior da loja vai parecer realmente escura. O mesmo problema acontece se escolhermos luminárias abertas que deixam aparente as lâmpadas em um ângulo baixo de visão, ofuscando da mesma forma e obrigando a pupila a se contrair, o que representará um enorme desperdício de energia luminosa. A solução é exagerar um pouco no projeto luminotécnico para balancear esse aspecto comparativo ou barrar a visão externa que o público terá do exterior do ambiente ou das lâmpadas que estiverem mais baixas. Interessante observar que no interior de qualquer elevador nunca sentimos que estamos em um local escuro, sendo que nas medições com luxímetro pode-se chegar a apenas 100 lux neste ambiente.

O maior desafio dos nossos tempos em termos de iluminação é sem dúvida a correta e difícil manipulação da luz natural, de forma a evitar o calor excessivo, o ofuscamento, a luz direta sobre o ambiente e a uniformidade da iluminação nos ambientes fechados. Isso significa a solução de temas muito importantes em nossos tempos, como a preservação do meio ambiente e redução dos custos de energia.

A luz como fenômeno cultural:

Se queremos dizer que um ambiente é mais ou menos sofisticado não há nada mais importante que exprimir isso através da luz. Ambientes com luz artificial fria, intensa, uniforme e mole (sem sobras), cria em qualquer tipo de arquitetura de interiores a sensação que estamos em um local sem diferencial de sofisticação, representando locais mais populares e de apelo promocional para o público de diversas classes sociais. Se o ponto-de-venda quer atingir o público através da estratégia do preço baixo terá que inevitavemente utilizar esse tipo de luz. Mas se encontramos uma arquitetura de interiores com iluminação artificial quente, focal e dura (com sombras definidas nos objetos), logo acreditamos estar em um ambiente aconchegante e diferenciado. Ótimos restaurantes, lojas de grife e outros ambientes de luxo necessitam desse tipo de atmosfera. A explicação para esta sensação de relaxamento e conforto provocada em nosso cérebro pode estar no estudo da antropologia, pois nossa espécie passou milhares de anos utilizando o fogo como fonte de luz artificial, especialmente nos momentos de reunião em grupo na hora da alimentação, enquanto a luz do dia representou o período de atenção na luta pela sobrevivência.

Outro aspecto da luz que é totalmente subjetiva e que pertence ao estudo da neurolinguística é a leitura que fazemos de um ambiente. Conceitualmente, o claro só pode ser considerado claro pois há a noção do que é escuro, e vice versa. Um ótimo projeto luminotécnico pode ser totalmente correto mas poderá ser um desastre se os acabamentos do local forem escuros. O tamanho do ambiente também pode ser modificado pelo projeto luminotécnico, se a luz das superfícies que derem efeito de fundo infinito como paredes brancas receberem maior fluxo luminoso com luminárias direcionadas teremos a idéia de espaço maior, enquanto o foco nas lâmpadas no centro do ambiente irá deixar o espaço menor.

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei da observação sobre a insuficiência de leitura dos luxímetros, como se fosse o único parâmetro da qualidade visual. O assunto é facinante e gostaria de contribuir. Os níveis exteriores da ordem de 20.000 lux são com dia nublado pois, com céu sem nuvens, entre 10:00 e 15:00 os níveis de iluminação estão com mais de 70 mil lux, chegando a mais de 100 mil no verão! A esse respeito tenho uma outra observação que é a comparação que se faz com o fundo: ao observarmos o interior do ambiente, onde há uma janela para uma área aberta e clara, fazemos uma comparação imediata, o que nos traz a sensação que está escuro. Isso significa que as áreas a serem valorizadas devem ter um bom nível de contraste com o fundo - com cores escuras ou áreas sombreadas - o que poderá valorizar muito bem um produto sem necessidade de aumentar a fonte de luz. Sobre o uso da luz natural, o aquecimento é normalmente trazido com a insolação - radiação direta - e isso deve ser resolvido com o uso de redirecionamento, brises, máscaras solares, prateleiras de luz e outros artefatos que conduzem a luz - indireta e difusa - sem aquecer. Os focos de valorização podem também ocorrer com clarabóias - lembrando que esses focos de sol serão pontos de aquecimento e assim devem ser bem reduzidos, além do fato de que esses focos "caminharão" com o passar das horas do dia! Enfim, é um tema apaixonante e com o desenvolvimento de fontes artificiais com baixo consumo e diversos ângulos de foco é possível trazermos beleza, valorização e harmonia para melhorar a qualidade visual. Arq. Sigfrido F C G Graziano Junior (48) 9983-6143 www.sig.arq.br
autor: Sigfrido F. C. Graziano Junior - 29/04/2010

Desculpem a falta de revisão, pois escrevi facinante quando seria fascinante.
autor: Sigfrido F. C. Graziano Junior - 29/04/2010

Achei o assunto bastante interessante, porém é preciso que o autor revise algumas terminologias luminotécincas utilizadas (iluminância? luminânica?). Duas palavras parecidas mas significados diferentes. Outro aspectos sobre o textos é definir o que o autor chama de especialista de iluminação sendo o espalhador de luminárias no teto ou o indivíduo realmente preparo para realizar esta função. Por fim, ainda falando de iluminância e luminância, o bom especialista está mais preocupado com as luminâncias, pois a iluminâncias não são vistas pelo nosso olho.
autor: Paulo Cesar Cobucci - 28/04/2010